REISADO DE CARETAS DO SÃO JOAQUIM FORTALECE VÍNCULO COM O SEMIÁRIDO











REISADO DE CARETAS DO SÃO JOAQUIM FORTALECE VÍNCULO COM O SEMIÁRIDO 


No distrito de São Joaquim, município de Senador Pompeu, Estado do Ceará, um grupo de agricultores mantém a tradição de reisado de caretas há mais de 55 anos.  É uma atração esperada pelas pessoas da comunidade, durante todo o ano. Geralmente acontece nos meses de dezembro e janeiro, dentro do ciclo natalino, encerrando a brincadeira no dia 06 de janeiro alusivo ao dia de Reis. Crianças, jovens e adultos se reúnem nos terreiros das comunidades por onde os brincantes passam, para assistirem à brincadeira que encanta e diverte a todos.

O reisado de caretas é característico da região  Sertão Central do Ceará, folguedo composto de cortejo, abrição de portas, sapateados e apresentação das figuras: Ema, Boi, Burrinha, Jumento e Zé Bundinha. Esse folguedo é permeado de uma musicalidade intensa, que anima e conduz a dramaticidade e as figuras. Um misto de profano e sagrado. É resultante da fusão de diversos elementos de diferentes tradições e épocas, que ao longo do tempo foram incorporados e assimilados por gerações de brincantes, resultando no reisado de boi de caretas, um reisado de retorno. Representa o retorno dos Reis Magos da visita ao Menino Jesus. Por isso as mascaras (máscaras de couro), para não serem reconhecidos por Herodes.  As figuras principais são a burrinha e o boi, por serem animais que estavam no local do nascimento do Menino Jesus.

Trata-se de um dos grupos de reisados de caretas mais original e tradicional do Ceará. Devido ao isolamento da comunidade que está situada no sopé da serra, limite dos municípios de Senador Pompeu e Pedra Branca. O grupo mantém a originalidade da apresentação tal qual era no princípio do século XX, não tendo sofrido influências modernas.

João Inácio e João André são os mestres do grupo, assim como todos os brincantes, aprenderam a tradição através de seus pais, quando ainda crianças assistindo as brincadeiras nos terreiros dos povoados. Para o mestre João Inácio de 89 anos, a brincadeira o torna mais feliz e motivado, mesmo com a idade avançada mantém uma pequena propriedade no sopé da serra de Pedra Branca e juntamente aos filhos tira da terra o suficiente para a sobrevivência da família.

O ato de brincar no reisado de boi de caretas é um misto de prazer e devoção, envolvendo o sagrado e o profano em um só espaço, sendo algo mágico, ancestral. O folguedo encanta e diverte, com música, dança, poesia, drama, presentes no versejar dos caboclos mestres, na execução de coreografias pelos caretas em torno das figuras e na teatralização da morte do boi.

As figuras têm forte simbologia, representam a ligação do ser humano com a natureza e a terra. O boi é uma figura encantadora, mágica, sagrada, ele é sacrificado e ressuscita, a ema está ligada à natureza, à nossa fauna e figuras como o Zé Bundinha e o Jumento estão voltados mais para a comicidade, o lúdico, fazendo a interação com o público e provocando o riso.

Os mestres têm a preocupação em repassar a tradição para as crianças e jovens, mantendo no grupo crianças aprendizes e jovens brincantes, que são instruídos pelos mestres. O grupo de reisado de caretas do São Joaquim também participa de vivências com crianças e adolescentes no sentido de repassar a tradição para as novas gerações, como aconteceu na comunidade de Engenheiro José Lopes, também distrito de Senador Pompeu, onde 20 crianças integrantes do Projeto Cultivando Vida e Arte no Semiárido participaram de vivências com o grupo. As crianças e adolescentes, aprenderam a respeitar, admirar e vivenciaram na prática as danças, os  cantos e dramas que envolvem a tradição. Possibilitou um aprendizado diferenciado, contextualizado, onde as crianças interagiram diretamente com os mestres, com os caretas, com os músicos e as figuras. Quando crianças têm contato direto, vivenciam a tradição, absorvem espontaneamente os códigos culturais, que passam a fazer parte da sua identidade cultural.

A comunidade de São Joaquim tem uma relação muito forte com a tradição, sente orgulho do grupo que foi titulado pela Secretaria da Cultura, Tesouros Vivos do Ceará. É uma relação de admiração e respeito, de crianças, jovens, adultos e idosos. “A gente vive neste pé de serra, a nossa diversão é o reisado, desde criança que eu gosto de ver os caretas brincando, é uma diversão muito boa para todos os moradores”, afirma Dona Angelita, 78 anos. 

A brincadeira, termo usado pelos integrantes do grupo, acontece nos terreiros das casas, como manda a tradição, envolvendo diversas comunidades, com todas as faixas etárias de público, participando, interagindo com os brincantes. Isso promove a integração, a socialização e o fortalecimento da identidade cultural da comunidade. A brincadeira de reisado de caretas é para os brincantes um elemento fundamental no sentido de superar as adversidades da região semiárida. O ritual que a envolve apresenta simbologias diversas que estão ligadas ao fortalecimento do indivíduo, do grupo e da comunidade.

Nesse aspecto o reisado transcende o ato de brincar e passa a elevar, fortalecer, tanto os brincantes como aos que assistem. A cultura é fundamental no sentido de buscar alternativas de convivência com o semiárido, também liga o homem e a mulher do sertão à sua terra, dando sentido à existência.


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1 Comentários

  1. Parabéns!! adorei o recorte cultural, em especial desta manifestação popular tão presente no meio rural!! o semiárido é lugar de gente feliz!!!Um abraço!
    Cristina
    CETRA

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